terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Um grito de génio: Gonçalo M. Tavares

O Amor não Rende Juros 137 É verdade «que um baixo amor os fortes enfraquece» mas também o grande amor torna ridículos os grandes, pois o amor é, em energia material sobre o mundo, um roubo — apesar de, em sensações, ser magnífico. 0 amor será útil internamente, mas externamente não carrega um tijolo. Disso nunca tive dúvidas. 138 A vida, é certo, não será um sítio excepcional para as paixões. Nos países humanos, o amor mistura-se muito com palavras equívocas. 0 fogo que existe numa lareira, por exemplo, é um fogo servil, cultural, educado. Uma coisa vermelha, mas mansa, que nos obedece. Só é natureza, o fogo na lareira, quando, vingando-se, provoca um incêndio. E o amor assim funciona. Mas é preferível o contrário. 139 É desarranjo de estratégias e planos, surpresa ritmada, uma ilegalidade exaltante que não prejudica os vizinhos. Mas atenção, de novo: o amor não faz bem aos países, não desenvolve as suas indústrias, nem a economia. Disso nunca tive dúvidas. E por isso é preferível não. 140 No entanto, qual é o país que pode impedir que o amor entre? Não é mercadoria traficada em caixas, que as caixas são objectos que se abrem ao meio — e é possivel, com uma lanterna, olhar lá para dentro. 141 0 amor não se vê como se fosse uma presença. É demasiado completo para ter uma forma. E como jamais se conseguiram obter juros de uma coisa que não ocupa espaço, é preferível não, parece-me. Gonçalo M. Tavares, in "Uma Viagem à Índia"

Sem comentários:

Enviar um comentário