segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Grito 57


Achava que não podia ser magoada


Achava que não podia ser magoada;

achava que com certeza era

imune ao sofrimento —

imune às dores do espírito

ou à agonia.


Meu mundo tinha o calor do sol de Abril

Meus pensamentos, salpicados de verde e ouro.

Minha alma em êxtase, ainda assim

Conheceu a dor suave e aguda que só o prazer

pode conter.


Minha alma planava sobre as gaivotas

que, ofegantes, tão alto se lançando,

lá no topo pareciam roçar suas asas

farfalhantes no teto azul

do céu.


(Como é frágil o coração humano,

um latejar, um frémito,

um frágil, luzente instrumento

de cristal que chora

ou canta).


Então de súbito meu mundo escureceu

e as trevas encobriram minha alegria.

Restou uma ausência triste e doída

onde mãos sem cuidado tocaram

e destruíram

minha teia prateada de felicidade.


As mãos estacaram, atónitas.

Mãos que me amavam, choraram ao ver

os destroços do meu firmamento.


(Como é frágil o coração humano —

espelhado poço de pensamentos.

Tão profundo e trémulo instrumento

de vidro, que canta

ou chora.)



Sylvia Plath

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